O menino das memórias inventadas



"Hoje eu completei oitenta e cinco anos. O poeta nasceu de treze. Naquela ocasião escrevi uma carta aos meus pais, que moravam na fazenda, contando que eu já decidira o que queria ser no meu futuro. Que eu não queria ser doutor. Nem doutor de curar nem doutor de fazer casa nem doutor de medir terras. Que eu queria era ser fraseador. Meu pai ficou meio vago depois de ler a carta. Minha mãe inclinou a cabeça. Eu queria ser fraseador e não doutor. Então, o meu irmão mais velho perguntou: Mas esse tal de fraseador bota mantimento em casa? Eu não queria ser doutor, eu só queria ser fraseador. Meu irmão insistiu: Mas se fraseador não bota mantimento em casa, nós temos que botar uma enxada na mão desse menino pra ele deixar de variar. A mãe baixou a cabeça um pouco mais. O pai continuou meio vago. Mas não botou enxada."


Memórias inventadas: a Infância / Manoel Barros. São Paulo: Planeta, 2003.

E que falta fará o nosso menino das memórias inventadas!! O poeta da natureza, segundo Valter Hugo Mãe . A perda de um poeta deixa nossa vida menos equilibrada. A poesia é vital , mesmo para quem não sabe disso. A chama acesa , que é a poesia de Manoel de Barros, não se apagará para quem não vive sem a poesia.




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